O perdão na filosofia

O Perdão na Filosofia: Da Autonomia de Kant à Desconstrução de Derrida e à Complexidade de Ricoeur

O conceito de perdão, ao longo da história filosófica, passou por transformações marcantes que moldaram sua compreensão moderna. Immanuel Kant, com sua visão revolucionária, abriu caminho para uma abordagem mais humana e autônoma do perdão.

Kant, defensor da autonomia humana, desvinculou o perdão da esfera divina, conferindo ao indivíduo a responsabilidade por suas ações. Sua filosofia crítica questionou dogmas e estabeleceu a importância da razão na tomada de decisões éticas. Foi Kant quem trouxe o perdão do plano divino para a ética humana, destacando o papel da pessoa ofendida na concessão do perdão.

No entanto, apesar da contribuição de Kant, o perdão foi, por muito tempo, relegado à esfera religiosa. Jacques Derrida, pós-Segunda Guerra Mundial, e influenciado pelos processos de reconciliação na África do Sul e no Chile, resgatou o perdão como objeto de reflexão filosófica. Derrida desafiou a ideia convencional do perdão e afirmou que perdoar o perdoável não é verdadeiramente perdão. Para ele, o perdão deve enfrentar o imperdoável, sendo uma prova de fogo e uma espécie de loucura que faz o impossível.

A globalização do perdão, marcada por pedidos formais de desculpas por entidades como a Igreja Católica e governos, despertou o interesse de Derrida. No entanto, ele alertou para o risco de banalização do perdão, ressaltando a importância de uma volta ao passado, um ato de memória e auto-acusação. Derrida enfatizou que o perdão não pode ser automatizado ou ritualizado; é um ato excepcional e divino, mesmo quando praticado pelo homem.

Paul Ricoeur, por sua vez, dedicou-se a compreender a dificuldade intrínseca ao perdão. Para Ricoeur, o perdão é um ato inacabado que surge para resolver conflitos não resolvidos. Ele diferenciou o perdão da anistia, destacando que o perdão inclui a memória e é um ato particular e individual da vítima. Justiça e perdão, embora se aproximem, não se confundem; enquanto a justiça lida com questões externas, o perdão envolve uma transformação interna e subjetiva.

Immanuel Kant, Jacques Derrida e Paul Ricoeur convergem em um ponto central: o perdão é uma ação que requer a decisão do indivíduo, sem intermediários divinos ou estatais. A autonomia e a vontade do sujeito são fundamentais para o perdão genuíno. Esses filósofos desafiaram concepções tradicionais e instigaram uma reflexão profunda sobre a natureza complexa do perdão.

O perdão, assim apresentado por esses pensadores, transcende a mera aceitação de desculpas. É um ato de coragem, uma escolha consciente de liberar ressentimentos e aliviar as dores da alma. A filosofia, ao explorar o perdão, convida-nos a repensar nossa atuação no mundo e a compreender a verdadeira essência desse ato transformador. No próximo artigo, adentraremos a visão do perdão na Psicologia Positiva, explorando as implicações desse fenômeno na saúde mental e no bem-estar.

Fonte: Livro – O Poder Terapêutico do Perdão – Adriana Santiago – Editoria Leader 

28/11/2023

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