Tenho desenvolvido estudos baseados em pesquisas científicas no sentido de identificar no espectro cultural duas tipologias de sociedades: as emocionais e as cerebrais ou contratuais. Trata-se de uma análise com um viés social e antropológico, no sentido de tentarmos entender o funcionamento dessas sociedades. Não há, portanto, nenhum juízo de valor no sentido de que uma seria melhor do que a outra. As sociedades cerebrais/contratuais tendem a ser mais baseadas na lei, no que está acordado ou contratado. As ações pessoais estão pautadas na memória de leis mais rígidas. E isso traz para o dia a dia do cidadão comum características de comportamento, uma vez que as relações são regidas por regras claras e objetivas. As sociedades emocionais também têm regras,mas estão à serviço de uma interpretação dos sujeitos que vão buscar sempre adequá-las ao que seria melhor para ele, não para a maioria. E isso traz para o dia a dia uma maior flexibilidade.
Não há uma sociedade contratual nem uma sociedade emocional perfeita, existem algumas que tendem mais para um lado e outras que tendem mais para outro, por isso tratamos o assunto como um espectro que permite uma classificação mais adequada. Não podemos trabalhar com uma situação absoluta e conclusiva, porque todas as sociedades têm traços que podem nos levar a interpretações diferentes. Esse raciocínio pretende contribuir para o entendimento do produto cultural que é um importante influenciador da forma como essas pessoas operam o mundo.
Para isso vamos precisar aprofundar. Cada tipo de sociedade, além de ser considerada emocional ou cerebral/contratual, está numa faixa etária. Para encontrarmos a idade aproximada de cada sociedade temos algumas chaves que são os dados de natureza demográfica, histórica, social etc. Um ponto estrutural desses estudos é o processo de colonização de cada país, que influencia fortemente na formação do inconsciente coletivo, o que produz um conjunto de ações e atitudes que são visíveis. O que ainda permanece inconcluso é o conjunto de fenômenos que leva um país a determinado estágio onde pode ser mais emocional ou mais cerebral/contratual.
Estes aspectos vão influenciar o modus operandi de todas as arenas da sociedade. Esse raciocínio permite que façamos uma interpretação de algumas questões embora não seja suficiente para diagnosticar e enquadrar uma cultura num modelo, mas para entendermos o projeto cultural de cada nação.
Vamos trabalhar com exemplos que facilitem o entendimento do que foi até agora tratado de forma teórica. O Brasil assim como as sociedades latinas tende mais para o polo emocional quando comparadas a outras culturas.
O Brasil no esporte por exemplo, é conhecido como o país do futebol, um esporte coletivo, onde nos destacamos tanto, que a cada dia descobrimos em algum país um brasileiro jogando futebol e fazendo sucesso em times locais. É quase um “produto” de exportação. Isso nos remete para ao popular “jogo de cintura”, da mesma forma vamos ver bailarinos se destacando nas mais diferentes companhias de danças do mundo inteiro.
Isso ocorre no campo do esporte e da arte da dança, podemos tratar de muitas outras arenas e tentar entender por essa leitura alguns fenômenos estatísticos por esse viés.
Entretanto devo dizer que nada é tão conclusivo assim, por exemplo, o Brasil tem sido uma referência de sociedade quando se trata do combate ao fumo. Já não há necessidade de tantas placas informando que “é proibido fumar”, nem mesmo nos locais de lazer como boates e bares as pessoas procuram locais apropriados, abertos para a prática do fumo. A lei existe, não está escrita e nem precisa ser lembrada com placas de advertência para que todos a cumpram de forma rigorosa. Esse é um traço de uma sociedade cerebral dentro de uma sociedade emocional.
Estes são apenas alguns exemplos para começarmos a entender a nossa sociedade, pois é nela que estão inseridos os pacientes que chegam as nossas clínicas e entender o contexto de onde estão vindo, é fundamental para a compreensão do cenário que os envolve.
Por outro lado, somos um país extremamente diverso que acolhe povos do mundo inteiro e por isso temos que estar a cada dia mais preparados para entender quem são aqueles que estão a nossa frente.
Numa anamnese teremos sempre dados demográficos, vamos entender esse paciente por suas origens e por sua história pessoal, familiar e cultural, isso tornará o nosso trabalho mais rico e os profissionais mais qualificados para a escuta ativa.
O trabalho do profissional de psicologia supõe a leitura dos sujeitos em todos os seus ângulos, esse é um ponto muito importante e que também deve ser estudado com a devida atenção.
Voltaremos ao tema falando mais um pouco sobre essas importantes diferenças entre as sociedades emocionais e as sociedades cerebrais/contratuais.
Ricardo de Sá
Fontes de estudo:
https://blog.runrun.it/dimensao-cultural/
https://medium.com/o-inovador-brasileiro/minhas-refer%C3%AAncias-geert-hofstede-5b66356636c9